por Alison Abbott
O mundo vibrou na semana passada com a notícia de que um gel antirretroviral pode reduzir pela metade a incidência do HIV em mulheres.
No entanto, uma vibração mais discreta pôde ser ouvida na Conferência Internacional sobre a Aids (Aids 2010) em Viena, onde os resultados do gel foram revelados. Em sessão especial, incluída no programa no último minuto, os participantes ouviram os resultados de alguns bem-sucedidos, mas pequenos, testes clínicos preliminares realizados com vacinas terapêuticas – que se acreditava ser um beco sem saída na luta contra o HIV.
Vacinas normais são projetadas para prevenir infecções, mas até agora nenhuma tinha funcionado com o HIV. Vacinas terapêuticas, em contraste, visam a tratar as pessoas infectadas – no caso do HIV, por meio do fortalecimento do sistema imunológico debilitado. Porém, os testes clínicos iniciais dos anos 90 foram desapontadores e as vacinas saíram da moda científica.
Combinações de drogas que diminuem as concentrações virais se tornaram o principal método para tratamento do HIV, mas não eliminam completamente a doença. “Esses medicamentos deixam os pacientes com um nível de ativação imunológica perigoso, que pode causar envelhecimento prematuro”, afirma Joep Lange, virologista clínico da University of Amsterdam e ex-presidente da Sociedade Internacional de Aids. “A abordagem das vacinas terapêuticas pode ajudar nesse ponto”, observa ele, “ao modificar as respostas imunológicas”.
Lange está animado com os resultados dos testes, mas adverte que até agora são muito limitados e, mesmo que as vacinas funcionem, nunca vão substituir as drogas. Alguns pesquisadores-chave continuam a acreditar que vacinas terapêuticas não se provarão úteis no longo prazo.
Todas as vacinas, que foram desenvolvidas por várias pequenas empresas de biotecnologia, modesta mas significativamente reduziram os níveis virais no sangue de pacientes, que responderam durante meses ou mais. Em alguns casos, as vacinas também aumentam os níveis de células T CD4+ (as vitais células imunorreguladoras que o HIV depleta). Em teoria, as vacinas só precisariam ser administradas a intervalos de poucos meses.
Dois dos testes fase II relatados na reunião se concentraram em melhorar a eficiência das células dendríticas do sistema imunológico. Essas são as células que levam os antígenos estranhos – neste caso, proteínas do HIV – para as células T, de modo que possam reconhecer e eliminar os invasores.
Uma abordagem, desenvolvida pela Genetic Immunity, empresa de biotecnologia com sede em Budapeste, envolve a criação de nanopartículas que contêm trechos selecionados do RNA proveniente do HIV. A preparação é aplicada nos pacientes por meio de um adesivo cutâneo. A pele sob o adesivo é levemente danificada para atrair os precursores das células dendríticas, expondo-os a 15 proteínas do HIV transcritas a partir do RNA.
A outra tática, da Argos Therapeutics de Durham, na Carolina do Norte, se baseia em vacinas feitas sob medida para cada paciente. Os pesquisadores extraíram células dendríticas e RNA viral de pacientes, então carregaram as células com o RNA antes de as reaplicarem no mesmo paciente.
Vacinas terapêuticas são normalmente testadas em pacientes já sob tratamento com drogas. Para evitar que os remédios confundam os testes, os pacientes precisam “tirar férias” da medicação durante os meses do teste. Porém, um teste com placebo realizado pela FIT Biotech de Tampere, na Finlândia, quebrou esse modelo ao recrutar 60 pacientes da África do Sul que nunca haviam sido tratados com drogas.
A vacina da FIT contém uma combinação de fragmentos de genes projetados para tornar o paciente imune a seis proteínas virais. Em cerca de 80% dos pacientes recebendo tratamento, o vírus foi suprimido e os níveis de CD4+ foram mantidos dois anos após a terapia começar.
Os resultados são particularmente relevantes para países como a África do Sul, onde muitos pacientes não têm um fácil acesso aos medicamentos, afirma Eftyhia Vardas, virologista da University of the Witwatersrand, que realizou o teste clínico em 2006 em Soweto, Johannesburgo. Vardas recorda ter se sentido como uma “rebelde” quando concordou em dar prosseguimento ao teste. Na época, o governo da África do Sul oficialmente negou que o HIV causava aids e seus colegas científicos não acreditavam que vacinas terapêuticas dariam frutos. Ela própria estava cética, relembra, depois de ter visto os outros testes falharem.
“Mas você não pode excluir nada quando as opções são tão limitadas”, observa ela. A África do Sul é o lar de 5,7 milhões de pessoas infectadas com HIV. Uma vacina, considera Vargas, “ajudaria a África do Sul a retardar a expansão da aids e reduzir a infectividade ao manter as cargas virais baixas quando as drogas não estiverem disponíveis”.
O valor das vacinas só vai se tornar claro quando os testes maiores da fase III começarem nos próximos anos.
Por enquanto, os líderes na pesquisa da aids estão cautelosos em relação aos resultados. Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas (NIAID, na sigla em inglês) dos EUA em Bethesda, Maryland, afirma que ele poderia imaginar um papel para “uma boa vacina terapêutica” para pacientes que foram tratados desde cedo e, portanto, têm apenas uma pequena reserva de HIV e cujos níveis sanguíneos de HIV são completamente suprimidos por drogas. Mas ele avisa que, como as vacinas causaram apenas uma modesta diminuição da carga viral, usá-las em lugar de drogas poderia permitir que os vírus sofressem mutações além do controle da vacina. “Esses testes iniciais envolvem pequenos números de pessoas”, adiciona Carl Dieffenbach, chefe da divisão de aids do NIAID. “Seria errado dar falsas esperanças às pessoas”.
Mas a Associação Nacional de Pessoas com Aids, um grupo de advocacia com sede em Maryland cujo vice-presidente de assuntos da comunidade, Stephen Bailous, organizou uma sessão especial, elogiou a abordagem. “Precisamos ter esperanças e algumas das vacinas terapêuticas parecem muito promissoras”, informa Bailou. “Se não pudermos depositar nossas esperanças nelas, então onde?”