Um serviço que, digitalmente, combina os DNAs de um homem e de uma mulher que pensem em ter um filho para identificar possíveis doenças genéticas que o bebê possa vir a ter deve ser lançado em dezembro nos Estados Unidos.
No início, o teste a ser disponibilizado pela empresa novaiorquina Genepeeks deve atender mulheres interessadas em usar o esperma de doadores anônimos para engravidar. A ideia é simular, por computador, antes da gestação, combinações entre o código genético de uma cliente e os códigos genéticos de vários doadores em potencial.
O processo, feito por computador, permite que os genes da cliente sejam combinados com o dos doadores milhares de vezes. Homens que frequentemente produzam com aquela mulher "bebês digitais" com alto risco de anomalias genéticas terão seu esperma excluído da lista de possíveis pais, deixando na fila doadores que produzam combinações melhores.
A proposta da Genepeeks já está gerando um debate sobre questões éticas.
Para alguns, iniciativas como essa tornam cada vez mais real a perspectiva de que, um dia, existam os chamados "bebês projetados" - descritos em obras de ficção científica como o filme Gattaca - Experiência Genética (1997).
Avanços Tecnológicos
"Estamos apenas dando a mães em potencial, que estão usando esperma de doadores para engravidar, um catálogo 'filtrado' de doadores baseado em seu próprio perfil genético", disse a cofundadora da Genepeeks, Anne Morriss, à BBC.
"Estamos eliminando os doadores com risco elevado de doenças pediátricas recessivas raras."
Morriss, uma empresária, fez uma palestra sobre sua companhia na Consumer Genetics Conference em Boston, nos Estados Unidos, na semana passada.
Ela foi motivada, em parte, por sua própria experiência quando começou sua família. Seu filho foi concebido com esperma de um doador que, assim como Morriss, carregava o gene para uma doença genética rara, chamada MCADD (sigla inglesa para Deficiência de Acil-CoA Desidrogenase de Cadeia Média).
A doença impede que a pessoa converta gorduras em açúcar, podendo ser fatal se não for diagnosticada cedo. Felizmente, no caso de Morriss, o problema foi identificado em testes quando o bebê era recém-nascido.
"Recebemos as sequências de DNA de dois parceiros em potencial. Simulamos o processo de reprodução, formando espermatozoides e óvulos virtuais. E os colocamos juntos, criando o genoma hipotético de uma criança. Assim, podemos estudar aquele genoma hipotético e - com todos os recursos da genética moderna - determinar os riscos de que o genoma resulte em uma criança com alguma doença. Nosso objetivo é identificar diretamente as doenças e não o status de portador (de um gene associado a doenças). Para cada par de pessoas que analisamos, fazemos 10 mil crianças hipotéticas."
Lee Silver, geneticista
"Meu filho tem uma vida normal", disse Morriss. "Mas cerca de 30% das crianças com doenças genéticas raras não ultrapassam os cinco anos de idade".
Genepeeks acaba de fazer uma parceria com um banco de esperma e iniciou o processo de registro da patente do teste que faz as combinações de DNA.
Teste 'ampliado'
Para casais que planejam iniciar uma família, outras companhias já oferecem testes para um, ou ambos os parceiros, que identificam genes que poderiam causar doenças se combinados com variantes genéticas similares. São os chamados "testes de portadores".
Comentando a inciativa da empresa americana, um acadêmico que estuda o uso de tecnologias genéticas disse: "Essa (tecnologia) é parecida (com as já oferecidas), mas ampliada 100 mil vezes".
O geneticista da Princeton University Lee Silver, que trabalha com Morriss, disse à BBC News: "Recebemos as sequências de DNA de dois parceiros em potencial. Simulamos o processo de reprodução, formando espermatozoides e óvulos virtuais. E os colocamos juntos, criando o genoma hipotético de uma criança".
"Assim, podemos estudar aquele genoma hipotético e - com todos os recursos da genética moderna - determinar os riscos de que o genoma resulte em uma criança com alguma doença. Nosso objetivo é identificar diretamente as doenças e não o status de portador (de um gene associado a doenças). Para cada par de pessoas que analisamos, fazemos 10 mil crianças hipotéticas".
O processo se repete com cada cliente e cada um de seus parceiros em potencial.
Os fundadores da empresa dizem ter planos de expandir os testes para identificar não apenas transtornos recessivos associados a um gene como também complicações provocadas por múltiplos genes associados.
Em um vídeo promocional, o geneticista Silver diz: "Tenho esperanças de que, no futuro, qualquer pessoa que queira ter um bebê possa usar essa tecnologia para reduzir os riscos de transmissão genética de doenças."
Incerteza
Especialistas entrevistados pela BBC disseram que o serviço oferecido pela Genepeeks é um resultado lógico da demanda cada vez maior por informações quando decisões envolvendo reprodução humana são tomadas, mas não representam uma resposta exata àqueles que temem geral um filho com problemas genéticos.
"A maior questão, para mim, é compreender o grau de incerteza envolvido. Mesmo pessoas que estudam genomas há anos ainda têm dificuldade em quantificar com exatidão os riscos que uma predisposição genética trazem para a vida de uma família", disse um especialista.
"Interações entre o gene e o ambiente podem levar as pessoas a apresentar, ou não, uma determinada doença."
Ewan Birney, diretor associado do European Bioinformatics Institute em Hinxton, Grã-Bretanha, concorda.
"Tenho certeza de que os cientistas têm compreensão dessa complexidade. Mas, ao comunicar essa complexidade para as pessoas no dia a dia, essas coisas podem soar mais absolutas do que são na realidade".
"É muito bom que as pessoas pensem em formas de usar essa tecnologia de maneiras diferentes, mas ainda existem muitas coisas que desconhecemos", ele acrescentou.
BBC
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